Actualidade
Artes Plásticas

Uólofe Griot: “O artista não pode só pintar porque sonhou, isso já não é aceitável”

Uólofe Griot: “O artista não pode só pintar porque sonhou, isso já não é aceitável”
Foto por:
vídeo por:
Andrade Lino

O artista visual angolano Uólofe Griot afirmou recentemente em Luanda que “o artista não pode só pintar porque sonhou ou porque se inspira na zungueira”, considerando já não ser aceitável isso nos dias de hoje, pois é necessário que ele faça pesquisas para apresentar hipóteses e propostas.

“Nós nos encontramos na época contemporânea, onde a arte passa a ser mais conceitual do que física”, reparou o artista plástico, por ocasião da inauguração, no dia 12 deste mês, da sua exposição individual “Kijimbuete”, no Elinga Teatro.

Segundo o também designer, “já não há tanta necessidade de o artista colocar a mão na massa, tanta necessidade de manufacturação da obra, mas sim no processo de pesquisa em arte que lhe facilite apresentar propostas”. “Hoje nós temos isso e acho bastante interessante e relevante, e a questão do mercado, embora ainda seja uma bolha, a cada ano que passa está a ficar maior e é algo muito bom para nós artistas”, apreciou.

Uólofe Griot, que falava exclusivamente ao ONgoma News, reconheceu entretanto que, apesar dos desafios, a arte angolana está num bom caminho, tendo apontado o facto de se estar “numa fase em que já temos uma universidade de arte”, algo positivo para ele, além de haver mais artistas académicos, “coisas que antigamente não havia, o que é muito interessante porque esses acabam por trazer processos de pesquisa”.

“Kijimbuete”, kimbundu para “símbolo” ou “indício”, está ligada com uma série de simbologia para exemplificar ou apresentar alguma ideia, e o artista conta que essa exposição teve um processo de pesquisa, sendo continuidade da amostra “Rainha Nzinga Mbandi”, decorrida no Palácio de Ferro.

“Tivemos uma certa pesquisa em Saurimo, durante três dias com a produção da Maia Tanner, a base de pesquisa serviu no processo da exposição ‘Kijimbuete’, que na verdade é um diálogo entre a nossa cultura e a globalização, uma inquietação minha, que é um dos exercícios que me propus a fazer com as minhas obras, trazer sempre temática africana, que para nós está ligada à espiritualidade, comunidade, sabedoria, filosofia e conhecimento”, explicou.

O expositor lembrou então que o trabalho sobre Nzinga Mbandi “foi algo bastante positivo, até porque permitiu dar sequência à exposição ‘Kijimbuete’ de uma forma mais abranjente”, acreditando que “era uma questão mais questionável sobre a real identidade da rainha”, uma vez que “as figuras que temos nos livros de histótia foram pintadas por um francês que a retratou e a imagem apresentada não é certamente fiel”.

Já Kijimbuete, conta Uólofe Griot, é mais firme porque tem arquivos fiéis, houve pesquisas mais concretas, são quatros obras com uma certa mesclagem, há várias camadas de várias culturas e vários povos, e “foi isso que permitiu a sequência da primeira exposição, porque em termos de técnica e estilo não há tanta diferença”.

No entanto, a escolha do espaço Elinga Teatro para a exibição desse trabalho surge como valorização da nossa cultura, porque, segundo disse, é necessário que se explorem vários espaços para não se ficar numa zona de conforto.

Representado pelo Espaço Luanda Arte, o entrevistado explicou ainda que a ave Sankofa, na qual se transforma nessa exposição, faz parte da simbologia adinkra, que fazia parte do Reino de Ashanti, na época mediaval, que agora é o Gana. “Ela tem essa particularidade de nos propôr olhar para o passado para saber o que o futuro nos preserva”, disse, referindo ainda que a ave vem com uma temática pedagógica que é “aprendermos com os nossos antepassados o que eles fizeram para hoje estarmos aqui presentes”, o que para ele tem uma grande importância na questão da valorização cultural, da comunidade, da espiritualidade e dos hábitos e costumes africanos.

Os doodles nas obras do Griot

Numa conversa paralela, o vencedor do Prémio Juventude na ENSA´ARTE XIV Edição, 2018, partilhou que os “doodles”, expressão em inglês para “rabiscos” ou “desenhos aleatórios”, técnica que muito identifica os seus trabalhos, vêm da influência dos artistas nigerianos Victor Ekpuk e Victor Ehikhamenor, que usam um tipo que é uma escrita africana milenar, além de vários. Já os seus fazem parte da sua cultura, sendo que se inspira em pictogramas e ideogramas africanos para conceber as suas obras, esclareceu.

“Victor Ehikhamenorr e Victor Ekpuk são artistas ascendentes que me influenciam bastante no meu processo de criação e no meu estilo dos doodles. Tenho algumas críticas positivas e negativas com várias fases de testar, várias fases de exprimentação, várias fases de conceber e aquilo acaba por ser mais diferente das obras que fiz em outras épocas”, partilhou.

Nessa ordem, o pintor desafiou os outros artistas a saírem da zona de conforto para não apresentarem sempre a mesma técnica e a mesma tendência, “porque isso acaba sendo algo limitador, tanto para o artista quanto para os receptores”. “É necessário que nós, os artistas, inovemos sempre as nossas mensagens, que quando o receptor chega, há sempre algo novo”, exortou a fonte.

Ainda nesse ponto, relevou que “o artista deve exercitar muito, porque chega uma época em que a idade já não vai permitir ser tão criativo”. “Então, enquanto estamos nessa fase, é bom que nós exploremos o máximo possível para que o futuro seja algo estável com valor, porque as obras de arte funcionam assim - elas passam a ganhar mais valor quanto mais o artista se expõe, quanto mais o artista se questiona, quanto mais o artista traz propostas para a sociedade, para a academia e outros”, finalizou.

Destaque

No items found.

6galeria

Rodeth Dos Anjos

Repórter

Licenciada em Ciências da Comunicação, Rodeth é mestre de cerimónias e fazedora de música ao vivo, tendo já trabalhado como educadora infantil e, entre outras valências profissionais, desenvolvido habilidades na área de reportagem.

O artista visual angolano Uólofe Griot afirmou recentemente em Luanda que “o artista não pode só pintar porque sonhou ou porque se inspira na zungueira”, considerando já não ser aceitável isso nos dias de hoje, pois é necessário que ele faça pesquisas para apresentar hipóteses e propostas.

“Nós nos encontramos na época contemporânea, onde a arte passa a ser mais conceitual do que física”, reparou o artista plástico, por ocasião da inauguração, no dia 12 deste mês, da sua exposição individual “Kijimbuete”, no Elinga Teatro.

Segundo o também designer, “já não há tanta necessidade de o artista colocar a mão na massa, tanta necessidade de manufacturação da obra, mas sim no processo de pesquisa em arte que lhe facilite apresentar propostas”. “Hoje nós temos isso e acho bastante interessante e relevante, e a questão do mercado, embora ainda seja uma bolha, a cada ano que passa está a ficar maior e é algo muito bom para nós artistas”, apreciou.

Uólofe Griot, que falava exclusivamente ao ONgoma News, reconheceu entretanto que, apesar dos desafios, a arte angolana está num bom caminho, tendo apontado o facto de se estar “numa fase em que já temos uma universidade de arte”, algo positivo para ele, além de haver mais artistas académicos, “coisas que antigamente não havia, o que é muito interessante porque esses acabam por trazer processos de pesquisa”.

“Kijimbuete”, kimbundu para “símbolo” ou “indício”, está ligada com uma série de simbologia para exemplificar ou apresentar alguma ideia, e o artista conta que essa exposição teve um processo de pesquisa, sendo continuidade da amostra “Rainha Nzinga Mbandi”, decorrida no Palácio de Ferro.

“Tivemos uma certa pesquisa em Saurimo, durante três dias com a produção da Maia Tanner, a base de pesquisa serviu no processo da exposição ‘Kijimbuete’, que na verdade é um diálogo entre a nossa cultura e a globalização, uma inquietação minha, que é um dos exercícios que me propus a fazer com as minhas obras, trazer sempre temática africana, que para nós está ligada à espiritualidade, comunidade, sabedoria, filosofia e conhecimento”, explicou.

O expositor lembrou então que o trabalho sobre Nzinga Mbandi “foi algo bastante positivo, até porque permitiu dar sequência à exposição ‘Kijimbuete’ de uma forma mais abranjente”, acreditando que “era uma questão mais questionável sobre a real identidade da rainha”, uma vez que “as figuras que temos nos livros de histótia foram pintadas por um francês que a retratou e a imagem apresentada não é certamente fiel”.

Já Kijimbuete, conta Uólofe Griot, é mais firme porque tem arquivos fiéis, houve pesquisas mais concretas, são quatros obras com uma certa mesclagem, há várias camadas de várias culturas e vários povos, e “foi isso que permitiu a sequência da primeira exposição, porque em termos de técnica e estilo não há tanta diferença”.

No entanto, a escolha do espaço Elinga Teatro para a exibição desse trabalho surge como valorização da nossa cultura, porque, segundo disse, é necessário que se explorem vários espaços para não se ficar numa zona de conforto.

Representado pelo Espaço Luanda Arte, o entrevistado explicou ainda que a ave Sankofa, na qual se transforma nessa exposição, faz parte da simbologia adinkra, que fazia parte do Reino de Ashanti, na época mediaval, que agora é o Gana. “Ela tem essa particularidade de nos propôr olhar para o passado para saber o que o futuro nos preserva”, disse, referindo ainda que a ave vem com uma temática pedagógica que é “aprendermos com os nossos antepassados o que eles fizeram para hoje estarmos aqui presentes”, o que para ele tem uma grande importância na questão da valorização cultural, da comunidade, da espiritualidade e dos hábitos e costumes africanos.

Os doodles nas obras do Griot

Numa conversa paralela, o vencedor do Prémio Juventude na ENSA´ARTE XIV Edição, 2018, partilhou que os “doodles”, expressão em inglês para “rabiscos” ou “desenhos aleatórios”, técnica que muito identifica os seus trabalhos, vêm da influência dos artistas nigerianos Victor Ekpuk e Victor Ehikhamenor, que usam um tipo que é uma escrita africana milenar, além de vários. Já os seus fazem parte da sua cultura, sendo que se inspira em pictogramas e ideogramas africanos para conceber as suas obras, esclareceu.

“Victor Ehikhamenorr e Victor Ekpuk são artistas ascendentes que me influenciam bastante no meu processo de criação e no meu estilo dos doodles. Tenho algumas críticas positivas e negativas com várias fases de testar, várias fases de exprimentação, várias fases de conceber e aquilo acaba por ser mais diferente das obras que fiz em outras épocas”, partilhou.

Nessa ordem, o pintor desafiou os outros artistas a saírem da zona de conforto para não apresentarem sempre a mesma técnica e a mesma tendência, “porque isso acaba sendo algo limitador, tanto para o artista quanto para os receptores”. “É necessário que nós, os artistas, inovemos sempre as nossas mensagens, que quando o receptor chega, há sempre algo novo”, exortou a fonte.

Ainda nesse ponto, relevou que “o artista deve exercitar muito, porque chega uma época em que a idade já não vai permitir ser tão criativo”. “Então, enquanto estamos nessa fase, é bom que nós exploremos o máximo possível para que o futuro seja algo estável com valor, porque as obras de arte funcionam assim - elas passam a ganhar mais valor quanto mais o artista se expõe, quanto mais o artista se questiona, quanto mais o artista traz propostas para a sociedade, para a academia e outros”, finalizou.

Rodeth Dos Anjos

Repórter

Licenciada em Ciências da Comunicação, Rodeth é mestre de cerimónias e fazedora de música ao vivo, tendo já trabalhado como educadora infantil e, entre outras valências profissionais, desenvolvido habilidades na área de reportagem.

6galeria

Artigos relacionados

Thank you! Your submission has been received!
Oops! Something went wrong while submitting the form