Caneta e Papel
Sociedade

Dois vil e vinte e os sorrisos reversos

Dois vil e vinte e os sorrisos reversos
Foto por:
vídeo por:
Widralino

Está claro que os cartomantes perderam os empregos, ou pelo menos a motivação para as suas actividades, depois de verem a “bater torto” as previsões sobre o que seria o ano de 2020.

Muito boas expectativas, e como em todos os anos, há gente que achou que seria esse o da redenção. Pode ter sido. Um ano para repensar as atitudes, com várias lições de agonia, notícias tristes um dia à frente do outro.

Foram mais de trezentos dias de pura dificuldade, de desacertos, incertezas e depressão. Acredito que todo mundo que passava a vida a denegrir os doentes mentais e as enfermidades emocionais pôde provar um pouco dessa sopa de desgosto. Várias coisas foram por água abaixo, desde planos à concretização dos mesmos, o mundo esteve parado e parados acabaram os corações de muitos. Uns deixaram de respirar naturalmente, outros induzidos ao coma eterno pela pandemia da Covid-19.

Perdemos estrelas, astros que brilhavam de diferentes maneiras, em diferentes áreas da vida. Do desporto à música, da música ao cinema, do cinema às artes plásticas, daí à família e da família aos amigos, enfim. Perdemos governantes. Sim, somos todos iguais, quando a morte decide fazer o seu tour sombrio no seio da humanidade. Um lembrete de que acabamos todos da mesma forma, sem vida. As almas não têm força para carregarem o poder numa mala, despem-se dos corpos e vão-se embora.

Então falemos um pouco de equidade. Precisamos tratar-nos uns aos outros de forma justa. Por que uns têm que respirar mais? Por que uns têm que viver e reviver, mas a maioria apenas sobreviver? Quantas vezes somos mortos antes que morramos de facto?

Ficamos até enjoados quanto tentamos nos lembrar dos fenómenos que aconteceram em distintas partes do mundo, nesse ano. Acreditava-se ser a consumação do fim do mundo, esse mundo que está nos seus últimos tempos há bastante tempo e, enquanto esperamos pelo triste desfecho, mais tristezas surgem-nos como presentes de Natal.

Incêndios, chuvas de impostos e promessas de que a vida vai mudar, enquanto parece-lhes, aos deuses, mais prático baixar os preços das bebidas a facilitar o acesso à comida. Mais um ano cuja luta não se limitou ao novos eventos, mas essencialmente ao de praxe, àquilo que é cultura desde que muitos de nós conhecemos como angolanos. A Covid arrasta milhões e milhões pelo mundo para as covas, fala-se em vacina, mas a maior pandemia de todas é a fome e a corrupção ainda torna Angola mais carente.

Onde é que anda o nosso dinheiro? Do que se recupera e do que se recebe para ajudar a nossa economia numa era tão difícil como essa, o que temos visto? São apenas certezas a reabertura das igrejas e bares, o reinício das aulas e palestras. Mas quando é que o país estará aberto para pensarmos livremente?

Enfim, um ano com muito para reflectir. Mais ainda para quem nos dirige, para quem agora já deve ter percebido que mais do que ouvir conselhos, é necessário saber tomar as próprias decisões, da maneira mais correcta e humana possível. Matamos médicos e estudantes, porém estamos em paz.

De Abril a Dezembro, ranger de dentes e pranto, com sossego na mistura, para quem teve a quarentena como arma para a criatividade, para quem aproveitou casar-se para se divorciar depois de tão pouco tempo, para quem pensou em dinheiro e começou a mexer-se para obtê-lo.

Acredito que, apesar dos choros, dos sorrisos reversos, o ano de dois vil e vinte trouxe, com o novo normal agora aplicado e que se vive, uma nova de forma de ver e viver a vida, para quem acredita em oportunidades. Muitas empresas fecharam. É hora de os desempregados irem atrás das ferramentas disponíveis gratuitamente por aí para se reinventarem, aprenderem novas coisas e começarem a construir as suas fontes de rendimento. É uma acção arriscada? Muito! Mas a fome não espera e a desgraça tem poderes de auto-clonagem.

Muitos souberam aproveitar as fendas e começam agora uma nova jornada nesse palco comercial da sobrevivência. Quando os planos de intervenção nos municípios enfrentam problemas processuais e as autarquias, afinal, nunca foram convocadas, empreendedores tentam outros caminhos, mas empreendem dores, por conta das más notícias que já nos trazem o ano de 2021 – “AGT avança retenção de 2,5% das operações em TPA”.

Nascem spoilers de que 2021 será um remake do ano que agora se despede, e os produtores de filmes de terror de realidade aumentada não poupam as suas ideias maquiavélicas, mas mantenhamos as cabeças frias e nos apeguemos à máxima “nada dura para sempre”.

Que façamos nós mesmos as novidades do próximo ano e, já agora, boas saídas e boas entradas!

Destaque

No items found.

6galeria

Widralino

Articulista

Poeta, prosador, fotógrafo, enfim, artista.

Está claro que os cartomantes perderam os empregos, ou pelo menos a motivação para as suas actividades, depois de verem a “bater torto” as previsões sobre o que seria o ano de 2020.

Muito boas expectativas, e como em todos os anos, há gente que achou que seria esse o da redenção. Pode ter sido. Um ano para repensar as atitudes, com várias lições de agonia, notícias tristes um dia à frente do outro.

Foram mais de trezentos dias de pura dificuldade, de desacertos, incertezas e depressão. Acredito que todo mundo que passava a vida a denegrir os doentes mentais e as enfermidades emocionais pôde provar um pouco dessa sopa de desgosto. Várias coisas foram por água abaixo, desde planos à concretização dos mesmos, o mundo esteve parado e parados acabaram os corações de muitos. Uns deixaram de respirar naturalmente, outros induzidos ao coma eterno pela pandemia da Covid-19.

Perdemos estrelas, astros que brilhavam de diferentes maneiras, em diferentes áreas da vida. Do desporto à música, da música ao cinema, do cinema às artes plásticas, daí à família e da família aos amigos, enfim. Perdemos governantes. Sim, somos todos iguais, quando a morte decide fazer o seu tour sombrio no seio da humanidade. Um lembrete de que acabamos todos da mesma forma, sem vida. As almas não têm força para carregarem o poder numa mala, despem-se dos corpos e vão-se embora.

Então falemos um pouco de equidade. Precisamos tratar-nos uns aos outros de forma justa. Por que uns têm que respirar mais? Por que uns têm que viver e reviver, mas a maioria apenas sobreviver? Quantas vezes somos mortos antes que morramos de facto?

Ficamos até enjoados quanto tentamos nos lembrar dos fenómenos que aconteceram em distintas partes do mundo, nesse ano. Acreditava-se ser a consumação do fim do mundo, esse mundo que está nos seus últimos tempos há bastante tempo e, enquanto esperamos pelo triste desfecho, mais tristezas surgem-nos como presentes de Natal.

Incêndios, chuvas de impostos e promessas de que a vida vai mudar, enquanto parece-lhes, aos deuses, mais prático baixar os preços das bebidas a facilitar o acesso à comida. Mais um ano cuja luta não se limitou ao novos eventos, mas essencialmente ao de praxe, àquilo que é cultura desde que muitos de nós conhecemos como angolanos. A Covid arrasta milhões e milhões pelo mundo para as covas, fala-se em vacina, mas a maior pandemia de todas é a fome e a corrupção ainda torna Angola mais carente.

Onde é que anda o nosso dinheiro? Do que se recupera e do que se recebe para ajudar a nossa economia numa era tão difícil como essa, o que temos visto? São apenas certezas a reabertura das igrejas e bares, o reinício das aulas e palestras. Mas quando é que o país estará aberto para pensarmos livremente?

Enfim, um ano com muito para reflectir. Mais ainda para quem nos dirige, para quem agora já deve ter percebido que mais do que ouvir conselhos, é necessário saber tomar as próprias decisões, da maneira mais correcta e humana possível. Matamos médicos e estudantes, porém estamos em paz.

De Abril a Dezembro, ranger de dentes e pranto, com sossego na mistura, para quem teve a quarentena como arma para a criatividade, para quem aproveitou casar-se para se divorciar depois de tão pouco tempo, para quem pensou em dinheiro e começou a mexer-se para obtê-lo.

Acredito que, apesar dos choros, dos sorrisos reversos, o ano de dois vil e vinte trouxe, com o novo normal agora aplicado e que se vive, uma nova de forma de ver e viver a vida, para quem acredita em oportunidades. Muitas empresas fecharam. É hora de os desempregados irem atrás das ferramentas disponíveis gratuitamente por aí para se reinventarem, aprenderem novas coisas e começarem a construir as suas fontes de rendimento. É uma acção arriscada? Muito! Mas a fome não espera e a desgraça tem poderes de auto-clonagem.

Muitos souberam aproveitar as fendas e começam agora uma nova jornada nesse palco comercial da sobrevivência. Quando os planos de intervenção nos municípios enfrentam problemas processuais e as autarquias, afinal, nunca foram convocadas, empreendedores tentam outros caminhos, mas empreendem dores, por conta das más notícias que já nos trazem o ano de 2021 – “AGT avança retenção de 2,5% das operações em TPA”.

Nascem spoilers de que 2021 será um remake do ano que agora se despede, e os produtores de filmes de terror de realidade aumentada não poupam as suas ideias maquiavélicas, mas mantenhamos as cabeças frias e nos apeguemos à máxima “nada dura para sempre”.

Que façamos nós mesmos as novidades do próximo ano e, já agora, boas saídas e boas entradas!

6galeria

Artigos relacionados

Thank you! Your submission has been received!
Oops! Something went wrong while submitting the form