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Widralino

Num dia como hoje, em 2020, gastei apenas 100 kwanzas para remendar um chinelo antigo e tive, no momento em que efectuava o pagamento, uma excelente epifania de poupança, que depois de alguns segundos transformou-se num aprendizado ou aula de economia.

Falo de economia como a ciência da alocação de recursos para satisfação duma necessidade individual ou colectiva, gestão do saldo positivo, canjonjar o dinheiro, em vez de devorá-lo já, o que for, ainda que os 'chuladores' nos rotulem como agarrados. Defendo ser mais do que certo negar-se a doar moedas para quem só quer se estragar, quando precisamos da massa para um bolo mais importante.

Percebi, olhando um pouco para trás, que é comum os sapateiros serem simples, e na maioria das vezes alcoólatras, sem querer aqui ferir sensibilidades. É com conhecimento de caso que digo isso, tendo em conta a experiência em esbarrar com esses especialistas das linhas e borrachas, a maioria sem graduação escolar. Desde os becos com lama do Nguanhã que sou cliente desses kotas, e ainda passo pelo Prenda para fechar um negócio um tio que cuida dos adornos e conforto para os pés. Falo dos que se sentam à porta de casa, num pequeno banco e exercem a sua actividade laboral, bem perto duma pracinha, ou mesmo dentro dela.

Diferente de quem monta uma pequena loja para alargar os calçados, além de lhe reparar as solas e os furos, muitos destes senhores nada mais querem senão o suficiente, ou para fortalecerem o estômago, ou para tentarem esquecer os problemas terrestres com uma pequena porção de caporroto. Acredite, já não julgo ninguém. Há coisas que, claro, sem medidas exageradas, são mais terapéuticas que sessões de auto-ajuda, quando a própria expressão deveria implicar a pessoa “se virar sozinha”.

Nessa senda de prática de preços que miram uma necessidade pequena, para nós, desgraçados iguais, ficam também mais reduzidos os gastos.

O que quero que entenda é que, eventualmente, quando alguém quiser lhe vender um serviço, é importante fazer uma leitura das suas ambições. Há vendedores mais estudados, que fazem cálculos bem aplicados, em termos de material usado e esforço mental despendido no trabalho, e por isso apresentam um orçamento que obriga a repensar a compra, porém há também quem só tem fome e sede, e que por mais prestativo e profissional que seja, parece não almejar riqueza financeira.

Poderia dizer que gosto mais do segundo tipo de comerciante. Mas seja qual for, prefiro o ainda humilde. O que fala 'mbora' o preço verdadeiro, ainda que sensivelmente alto, sem olhar para a minha cara e, do nada, levar-se a acreditar que existe nela um cidadão bem de vida. Aí eu confiro se o investimento vale a pena.

Amo os preços baixos. Quem não? Mas não quando com coragem dos vendedores os produtos apresentam-se em estado repelente, até porque todas mães já sabem que o barato custa caro. Gosto do angolano que cobra pouco, mas que, pela sua forma de lidar com o cliente, deixa-me com vontade de deixar cair um bónus.

Abomino os malandros que lançam preços altos e como que magia arreiam até as calças. Por que tanta instabilidade nos números? Que valor tem o negócio, afinal?

Isso para dizer que é preciso conhecer a barriga do muadié que já não vende, despacha, porque pode ser que o camarada só precise 'mbora' duma birra para relaxar a memória, “que há muito tempo não reina paz”.

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Widralino

Articulista

Poeta, prosador, fotógrafo, enfim, artista.

Num dia como hoje, em 2020, gastei apenas 100 kwanzas para remendar um chinelo antigo e tive, no momento em que efectuava o pagamento, uma excelente epifania de poupança, que depois de alguns segundos transformou-se num aprendizado ou aula de economia.

Falo de economia como a ciência da alocação de recursos para satisfação duma necessidade individual ou colectiva, gestão do saldo positivo, canjonjar o dinheiro, em vez de devorá-lo já, o que for, ainda que os 'chuladores' nos rotulem como agarrados. Defendo ser mais do que certo negar-se a doar moedas para quem só quer se estragar, quando precisamos da massa para um bolo mais importante.

Percebi, olhando um pouco para trás, que é comum os sapateiros serem simples, e na maioria das vezes alcoólatras, sem querer aqui ferir sensibilidades. É com conhecimento de caso que digo isso, tendo em conta a experiência em esbarrar com esses especialistas das linhas e borrachas, a maioria sem graduação escolar. Desde os becos com lama do Nguanhã que sou cliente desses kotas, e ainda passo pelo Prenda para fechar um negócio um tio que cuida dos adornos e conforto para os pés. Falo dos que se sentam à porta de casa, num pequeno banco e exercem a sua actividade laboral, bem perto duma pracinha, ou mesmo dentro dela.

Diferente de quem monta uma pequena loja para alargar os calçados, além de lhe reparar as solas e os furos, muitos destes senhores nada mais querem senão o suficiente, ou para fortalecerem o estômago, ou para tentarem esquecer os problemas terrestres com uma pequena porção de caporroto. Acredite, já não julgo ninguém. Há coisas que, claro, sem medidas exageradas, são mais terapéuticas que sessões de auto-ajuda, quando a própria expressão deveria implicar a pessoa “se virar sozinha”.

Nessa senda de prática de preços que miram uma necessidade pequena, para nós, desgraçados iguais, ficam também mais reduzidos os gastos.

O que quero que entenda é que, eventualmente, quando alguém quiser lhe vender um serviço, é importante fazer uma leitura das suas ambições. Há vendedores mais estudados, que fazem cálculos bem aplicados, em termos de material usado e esforço mental despendido no trabalho, e por isso apresentam um orçamento que obriga a repensar a compra, porém há também quem só tem fome e sede, e que por mais prestativo e profissional que seja, parece não almejar riqueza financeira.

Poderia dizer que gosto mais do segundo tipo de comerciante. Mas seja qual for, prefiro o ainda humilde. O que fala 'mbora' o preço verdadeiro, ainda que sensivelmente alto, sem olhar para a minha cara e, do nada, levar-se a acreditar que existe nela um cidadão bem de vida. Aí eu confiro se o investimento vale a pena.

Amo os preços baixos. Quem não? Mas não quando com coragem dos vendedores os produtos apresentam-se em estado repelente, até porque todas mães já sabem que o barato custa caro. Gosto do angolano que cobra pouco, mas que, pela sua forma de lidar com o cliente, deixa-me com vontade de deixar cair um bónus.

Abomino os malandros que lançam preços altos e como que magia arreiam até as calças. Por que tanta instabilidade nos números? Que valor tem o negócio, afinal?

Isso para dizer que é preciso conhecer a barriga do muadié que já não vende, despacha, porque pode ser que o camarada só precise 'mbora' duma birra para relaxar a memória, “que há muito tempo não reina paz”.

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